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“BAD BOYS PARA SEMPRE” – O ocaso em si mesmo

Afirmar que BAD BOYS PARA SEMPRE é reflexo do ocaso de Hollywood no quesito criatividade seria o mesmo que repetir um dos principais erros do próprio filme, qual seja, seu caráter genérico. Mais preciso é afirmar que o longa é o ocaso em si mesmo.

A obra coloca os policiais Marcus e Mike naquela que parece ser a sua última missão juntos. Dessa vez, enfrentam um poderoso cartel mexicano chefiado por uma fugitiva perigosa e cujo braço direito é seu filho, um frio e eficiente assassino. Em momentos distintos de suas vidas, Mike precisa convencer Marcus a desistir de se aposentar e assumir esse último caso.

(© Sony Pictures / Divulgação)

Ao contrário do que sempre faz Michael Bay em seus filmes de ação (e a citação é pertinente, vez que foi Bay quem dirigiu o primeiro filme da trilogia, em 1995), a direção de Abil El Arbi e Bilall Fallah não explora de uma maneira descaradamente machista o corpo das atrizes, tampouco exagera nas explosões e nos cortes. Isso não significa, contudo, que as mulheres não são objetificadas ou que a ação é bem dirigida. Ao revés, a objetificação feminina se percebe da função narrativa reduzidíssima que exercem, enquanto que a adrenalina é exposta de maneira caótica.

O roteiro de Chris Bremner, Peter Craig e Joe Carnahan, além de reduzir a vilã a uma perspectiva completamente unidimensional, ela é praticamente irrelevante em termos narrativos, dado que seu filho a desobedece mais de uma vez (de positivo, o fato de dois mexicanos conversarem entre si majoritariamente em espanhol, algo que nem sempre ocorre em produções hollywoodianas). Da mesma forma, a personagem de Paola Nuñes é limitada ao interesse afetivo (a rigor, muito mais sexual) de Mike, em um subplot que jamais se desenvolve. A participação de Vanessa Hudgens é tão diminuta que praticamente não se ouve a sua voz. Não é mera coincidência que Dorn (Alexander Ludwig) e Rafe (Charles Melton) tenham mais espaço (o primeiro para explicar seu perfil, o segundo como alívio cômico).

Quanto às cenas de ação, há muito barulho e muitas perseguições sem inovar em absolutamente nada. Nesses momentos, o que prevalece é uma bagunça visual embalada por uma trilha sonora que pode ter saído de qualquer outro filme similar – a única particularidade musical é a famosa Leitmotiv de Marcus e Mike. A estética de terror envolvendo a vilã é charmosa, mas muito mal explorada. No mais, não há nada marcante no filme.

Querendo diferenciar-se dos inúmeros projetos semelhantes, a obra quer surpreender a todo custo, o que ocorre já no prólogo, onde há quebra de expectativa. Entretanto, esse ímpeto é desnecessário, sobretudo na cena marcada por uma datação (“seis meses depois”). Aproveitando a mesma palavra, é notório que o filme é datado, colocando todas as suas fichas em um saudosismo presumido (difícil alguém defender a necessidade de um terceiro filme, salvo para fins exclusivamente lucrativos, é claro) e pela inverossimilhança liberada a partir do suposto humor (por exemplo, mesmo na iminência da chegada dos capangas, Mike e Marcus têm tempo de fazer observações jocosas sobre um hematoma do chefe).

Como se não bastassem as contradições (por que o capitão briga com Mike por ter extrapolado a função de consultor? Alguém compraria a ideia de que ele não esperava que isso ocorresse?) e as inconsistências (a esposa de Marcus o quer fora de casa apenas porque derrubou a hélice do ventilador de teto?), algumas cenas desafiam a inteligência do espectador (um drone barulhento passando despercebido a poucos metros dos criminosos, o retorno repentino – para não dizer mágico – de Marcus à ativa etc.).

A diferença das trajetórias de vida das personagens principais deveria ser um atrativo, mas a maneira pela qual é abordada apenas confirma a decadência de Will Smith e Martin Lawrence em suas carreiras. Se em Lawrence ainda subsiste algum timing cômico (a cena do avião é autenticamente engraçada, ainda que distante de hilária), a expressão constantemente indeterminada de Smith se aproxima da comédia acidental. Enquanto aquele não envergonha no drama, este parece ter esgotado, com o passar dos anos, todo o repertório de expressões dramáticas (que nunca foi exatamente extenso).

A ideia não é ruim: Marcus está em um novo momento, querendo se dedicar à família e aceitando que não é mais um garoto; Mike quer parecer imune ao envelhecimento, ao passo que admite questionar o vazio de tudo o que viveu (ou melhor, que deixou de viver ao não constituir família). Existe até mesmo um plot twist razoável que agita a trama em uma nova direção (ambas, a anterior e a nova, de encaminhamentos previsíveis, é claro). Porém, o terceiro filme da franquia “Bad boys” ratifica o crepúsculo de ideias novas, a aceitação do saudosismo como mola propulsora solitária e a desnecessidade de ser único em qualquer aspecto.