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“A ROTA SELVAGEM” – Não faz justiça [42 MICSP]

É coerente criar vínculos emocionais fortes e repentinos com pessoas estranhas, objetos ou animais em tempos de crise existencial e de profunda amargura da vida. O arco do protagonista de A ROTA SELVAGEM é um perfeito exemplo disso. Em um filme totalmente centrado no personagem de Charlie Plummer, há uma jornada de vários sentimentos como pertencimento, solidão e desamparo. O último é refletido em um roteiro que não agrada, comprometendo um sólido longa e o rebaixando para a – não menos que incrível – atuação de Plummer.


Charley é um garoto que vive com seu pai em Portland e encontra dificuldades em se estabilizar após várias mudanças. Ele começa um emprego em um estábulo de cavalos de corrida, onde se apaixona por Lean on Pete, um dos cavalos. A partir daí, Charley reflete todos os seus anseios em um relacionamento que o levará a uma jornada para, finalmente, se estabilizar.

A direção desse filme é de Andrew Haigh, que se mostra muito competente em um olhar individualista para a história. Logo, a perspectiva do protagonista é a tônica durante toda a trama, mesmo em lugares onde as incertezas e dúvidas parecem diminuí-lo. E é justamente onde o cineasta captura as dificuldades da jornada de Charley com primazia. Na sua essência, “A rota selvagem” é um road movie com elementos já conhecidos de filmes com relacionamentos humanos-animais. Convém mencionar esses rótulos por duas razões.

Primeiro, por se tratar de um filme genérico em suas fundações, como o relacionamento entre Charley e Lean on Pete e toda a construção da sua história errante até o destino final. A grande necessidade do protagonista de se estabilizar e idealizar o conforto na casa de sua tia justifica os aspectos vistos na tela, mas não convencem como uma excelente trama por ser repetitivo e previsível. Segundo, porque o ponto alto da película supera os aspectos narrativos e o próprio roteiro. A atuação de Plummer é uma âncora que provê segurança ao filme, concentrando uma carga dramática pessoal e uma ótima caracterização.

Há aqui uma prova definitiva de que Charlie Plummer é um ótimo ator e promete se desenvolver ainda mais no futuro. Em “A rota selvagem” ele entrega olhares vazios, profundos e reflexivos. Mistura a passividade dos acontecimentos com uma criativa mente que já arquiteta como continuar em frente. Características, sim, de um adolescente, mas que também revelam uma figura madura por trás do olhar confuso. Não é exagero dizer que sua atuação carrega o filme nas costas, provendo uma ponte que conecta, muito bem, o espectador aos dramas apresentados na trama.


Pouco constante em termos gerais, “A rota selvagem” é uma abordagem revigorada de histórias envolvendo a relação entre humanos e animais: revigora em aspectos como a procura por estabilidade, o trauma familiar, a solidão e o amadurecimento precoce. Contudo, seu desenvolvimento e roteiro não fazem justiça à atuação de Plummer, que se destaca como a melhor surpresa do longa. Apesar de tudo, é um filme sentimental. Porém, os sentimentos do espectador ao final podem não ser os melhores.