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“ALEX STRANGELOVE” – Muito strange e pouco love

Não é fácil para um filme iniciar em um sentido e encerrar em outro. As personagens não devem ficar estáticas quando a trama se encerra, porém é preciso haver coerência para que a mensagem seja eficazmente transmitida. Não é o caso de ALEX STRANGELOVE, que se inicia na insegurança e se encerra no coming out.

O protagonista do longa é Alex, adolescente prestes a terminar o ensino médio que tem como meta perder a virgindade com Claire, sua namorada. Porém, Alex fica em dúvida sobre sua própria orientação sexual ao conhecer Elliot, jovem assumidamente gay que o encanta desde o primeiro momento.

Se a esperança da Netflix com essa produção era dialogar com os adolescentes, certamente existem películas melhores (como “Com amor, Simon”, também lançado no primeiro semestre de 2018). É interessante tomar o sexo como uma questão para os adolescentes, já que se trata de um período de muitas novidades hormonais e de (construção da) personalidade, além das naturais dúvidas e da enorme insegurança. Trata-se de um ponto de vista realista (mencionando até mesmo o uso intenso do álcool e o consumo de maconha pelas gerações mais novas), fugindo do romance clichê.

A bem da verdade, o filme não é muito romântico: Alex se preocupa com seu futuro e com o sexo que pretende – com um planejamento surreal – ter com Claire, mas não em agradar a namorada. Madeline Weinstein (apesar do nome, ela não é parente daquele ex-produtor de Hollywood) é a melhor do elenco, pois Claire é provavelmente a personagem mais crível da história. Não que Alex ultrapasse o plausível ou que seu intérprete Daniel Doheny vá mal no papel, porém a indecisão tardia da personagem em nada contribui para que se torne um protagonista interessante.

Dito de outro modo, é difícil torcer por Alex, já que ele não encanta. Rigorosamente, pouco se sabe sobre ele: é bom aluno e presidente do grêmio estudantil, pretende trabalhar com biologia marinha, gosta de ir a festas com Claire e é virgem. Essas são informações esparsas que não permitem traçar um perfil completo da personagem. Alex parece oco, sendo, porém, vencido por um irrelevante Elliot. Antonio Marziale não tem nenhuma possibilidade de desenvolver o papel, vez que Elliot é apenas o garoto que desperta interesse no protagonista. A espontaneidade de Marziale, se bem utilizada, poderia ser uma virtude do longa.

O uso de narração voice over apenas no prólogo revela preguiça, valendo-se o roteiro de Craig Johnson de um recurso desnecessário para apressar o relacionamento entre Alex e Claire. A comparação dos estudantes do colegial com animais não é novidade em audiovisual e não chega a ser engraçada – embora tente. O humor da película é extremamente pueril (por exemplo, na sequência em que Dell, amigo do protagonista, tem alucinações), o que é aceitável, em razão do público-alvo. A trilha musical é bem presente, adquirindo função narrativa quando as canções são intradiegéticas. Johnson usa duas boas referências – “Gatinhas e gatões”, no texto, e “Moonlight: sob a luz do luar”, no quarto de Elliot (o pôster) -, porém sua direção tem no uso de zoom out os melhores momentos (ou seja, é extremamente precária).

Como nem tudo é ruim, há um bom diálogo de Claire com a sua mãe (que não deve durar mais de dois minutos) e o figurino é bem escolhido – por exemplo, Alex destoa de seus amigos, pois usa cores sóbrias e camisas de botão ao invés de camisetas, inclusive fechando as camisas até o penúltimo botão (abrindo somente em situações nas quais exerce a sua liberdade). O longa conta com dois finais: o primeiro é bem lírico e usa bem as luzes (razão pela qual não deveria haver o segundo), enquanto o segundo abraça uma transcendência que o filme não pretendia ter, sobre a “saída do armário” (coming out), o que não é o tema da película.

Em outras palavras, o plot se debruça na autodescoberta, ignorando completamente a auto-aceitação e fingindo não haver conflitos familiares e sociais (salvo nas menções de Elliot em relação ao pai). O mundo de Alex parece tão simplista e pacífico que seu maior dilema é descobrir a própria orientação sexual. Para o desfecho, o longa utiliza-se de deus ex machina (no insight do protagonista), associando o arco dramático do protagonista à “saída do armário”, que não é a sua trajetória. Assim, o filme falha como comédia e como mensagem.