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“COMO TREINAR O SEU DRAGÃO 3” – Um encerramento à altura de uma grande franquia

*Clique aqui para ler a crítica do primeiro filme, de 2010.

*Clique aqui para ler a crítica do segundo filme, de 2014.

Depois de dois episódios maravilhosos, COMO TREINAR O SEU DRAGÃO 3 é um desfecho digno de uma franquia do alto nível. O filme encerra o ciclo de amadurecimento de Soluço e Banguela, com um final condizente com o espírito da saga, que varia entre ação, drama e humor.

A trama do terceiro capítulo se inicia um ano após o encerramento do segundo, mais precisamente, em um momento em que Soluço e seus amigos salvam dragões encarcerados por caçadores. Essa atividade faz com que eles consigam inimigos, o que leva o novo líder de Berk à conclusão de que algo precisa ser feito para garantir a segurança de todos. Paralelamente, Banguela se apaixona por uma fêmea da sua espécie, que, ao contrário dele, não é muito receptiva aos humanos.

Cartaz de “Como treinar o seu dragão 3

O plot pode parecer mais brando que o dos anteriores, porém está assentado em quatro conflitos: o relacionamento entre Soluço e Astrid; a (falta de) confiança de Soluço em si mesmo; a proteção dos habitantes de Berk contra seus inimigos; e a liberdade de Banguela com a namorada.

Soluço e Astrid são apaixonados um pelo outro, porém a ideia de casamento não é bem aceita por ela, que não se sente pronta para dar esse passo. O protagonista já atua como líder da aldeia, contudo ele duvida do próprio valor, não confiando nas próprias virtudes e creditando a Banguela tudo que conseguiu. Os conflitos se complementam, pois é nesse impasse que Astrid mostra a Soluço as suas qualidades, fazendo-o ver que o dragão apenas facilitou que explorasse a própria coragem – característica que o jovem já tinha antes.

Soluço e Banguela têm muito em comum, a afinidade dos dois é incomparável. Entretanto, o protagonista precisa aprender sobre desprendimento quando seu dragão se apaixona por uma fêmea, nas suas palavras, “selvagem e arredia” (assim como a própria Astrid, como ele mesmo admite). Por outro lado, como líder, Soluço precisa proteger os habitantes de Berk de seus inimigos, uma vez que ele e seu grupo fazem inimigos ao libertar dragões de caçadores (como sua mãe vinha fazendo).

O vilão da vez é Crimmel, quase uma repetição de Drago, inclusive na unidimensionalidade. Diferente do anterior, Crimmel não tem interesse em controlar dragões além dos que controla (cerca de três ou quatro). Quanto ao tema, a ausência de explicação do poderio de Drago em face das criaturas é resolvido no terceiro longa, inclusive dando ao novo antagonista ferramentas com função narrativa. Ou seja, nessa falha do predecessor, Dean DeBlois faz um melhoramento do roteiro ao explicar como o vilão exerce o controle. Crimmel é melhor que Drago também do ponto de vista visual (não dependendo do mistério e não precisando ser sombrio), fazendo parte de um plot twist posterior a um plot twist.

No que se refere aos coadjuvantes, agora quem se destaca é Cabeçadura (e não a sua irmã Cabeçaquente, que só é importante em um momento, mais ao final), que se oferece como padrinho espiritual de Soluço e se gaba de uma barba falsa – como de costume, o humor repousa nas trapalhadas do grupinho de Soluço e na fofura desengonçada dos dragões (um enorme que não percebe o próprio tamanho, logo no início, além do flerte engraçadíssimo de Banguela). Melequento é outro destaque, dividindo-se entre o ciúme de Eret e a paixão por Valka. O roteiro tem ainda um subtexto sobre o respeito à natureza: mesmo sendo o ser humano a forma de vida dominante no planeta, há que se preservar os recursos naturais como os dragões (em linguagem literal, tudo que a natureza oferece).

Na direção, como Dean Deblois foi mantido, os recursos utilizados são basicamente os mesmos de antes, com o diferencial de que o conhecimento da franquia facilita o seu trabalho. Sem exagero estilístico, os flashbacks de Soluço e seus pais têm as bordas desfocadas, enquanto as cenas de ação são muito bem feitas (por exemplo, no plano-sequência do prólogo e na cena dos navios ao final). A trilha musical de John Powell não é exatamente inovadora, mas a repetição das melodias anteriores adiciona à qualidade das composições um saudosismo precoce.

O design de produção é um pouco diferente dos anteriores, investindo em uma pluralidade maior de cores, inclusive usando neon em uma cena. Berk está muito mais colorida, o que fica acentuado com a variedade de dragões. O realismo visual é assustador (a água da cachoeira e a aurora boreal parecem de verdade!). A animação é esplendorosa, com ápice na linda sequência de Banguela e a Fúria da Luz em uma tempestade, momento com cenários fascinantes e encantador simbolismo (as asas encostadas são um deleite para os românticos). A fêmea tem uma estética muito bem elaborada, quase o oposto de Banguela, dos olhos à pele, além da postura corporal (ela é muito mais ereta), o que é coerente com suas distintas personalidades (traduzindo-se também nas habilidades que eles demonstram).

A trilogia “Como treinar o seu dragão” tem lições valorosas e extrai incontáveis sentimentos do espectador. O terceiro episódio conta com um epílogo que aquece o coração do seu público, sintetizando a emoção indescritível que essa grandiosa franquia representa.