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“MAMMA MIA!” – Muita música e pouco filme

Bons musicais são aqueles que conseguem integrar os momentos de cantoria ao desenvolvimento dos personagens e dos conflitos dramáticos. Quando a balança pende apenas para um dos lados, problemas aparecem e podem ser tornar bem visíveis. MAMMA MIA! sofre do mal de se apegar à sua vertente musical e relegar ao segundo (e ao terceiro plano) os demais aspectos cinematográficos.

Na história, vemos os preparativos do casamento de Sophie por sua mãe Donna numa ilha grega, onde elas possuem um hotel. Enquanto isso, a noiva convida três antigos namorados da mãe na esperança de conhecer seu pai. A preocupação do filme parece ser empilhar sequências musicais em pouquíssimo tempo e frear o avanço da narrativa. A sensação de que acompanhamos um show ininterrupto de duas horas afeta os dramas que cercam os personagens: sempre em tom novelesco e caricatural, temos a trajetória de Sophie em conhecer seu passado pela descoberta do pai (na mesma batida repetitiva de situações e relações) e a aparição repentina de dúvidas em torno do casamento em Sophie e em seu noivo Sky. O principal tema, portanto, jamais engrena e é ofuscado por uma subtrama mal apresentada e desenvolvida.

Quanto ao seu ponto forte, não é possível ignorar a qualidade de algumas canções e as inserções na narrativa: títulos como “Mamma mia”, “Dancing queen” e “Voulez-vous” do grupo musical  ABBA, têm boa energia e são conduzidas numa coreografia de escala contagiante pela diretora Phyllida Lloyd, também responsável pela direção da peça homônima na Broadway . Outras, entretanto, surgem deslocadas dentro da produção e pecam, ou por seus poucos dotes estéticos, ou pelos momentos inapropriados de suas apresentações (por exemplo, em “Our last summer” e “Super trouper”, canções que não pontuam os sentimentos dos personagens porque simplesmente substituem preguiçosamente os diálogos).

A cineasta também abraça excessos bregas na filmagem das sequências musicais (especialmente quando os figurantes interagem entre si ou com os protagonistas), ainda que tais instantes não sejam sua maior falha. A dificuldade de trabalhar o elenco numeroso que tem em mãos e de costurar seus arcos dramáticos é o que mais incomoda. Além disso, ela se sabota ao desperdiçar tantos momentos para filmar os cenários paradisíacos da Grécia com a insistência no uso do chroma key (algumas sequências são filmadas em locações com belos planos gerais, porém são poucas).

Quando se trata do elenco, os maiores elogios recaem para a sempre competente Meryl Streep: ela transmite uma personalidade jovial e de grande energia através dos movimentos corporais, além de apresentar registro vocal afinado e presença cênica importantes para os números musicais. Já Amanda Seyfried alterna entre bons e maus momentos: quando atua de modo histriônico com tantos gritos e saltos deixa a desejar e cai numa caricatura; quando atua a partir das sutilezas de gestos e expressões, principalmente na relação com Donna, mostra mais recursos dramáticos.

As duas atrizes são comprometidas pela composição das personagens pelo roteiro. Donna sofre alterações constantes de personalidade que criam duas mulheres absolutamente conflitantes e problemáticas dentro de uma só: por vezes, é forte e independente capaz de levar sua própria vida, já em outras, acredita que precisa de um homem para o sustento de seu hotel e de sua vida e recebe críticas por ter se relacionado com três homens num breve período. E Sophie deveria ser retratada como uma jovem ainda indecisa sobre seu futuro e se questionando sobre as escolhas que fez, mas tem esse arco introduzido apenas nos 45 minutos finais da projeção com duas discussões abruptas com sua mãe e seu noivo.

A caricatura e a superficialidade são os traços característicos dos outros personagens, problemas pelos quais os atores não tem a menor culpa. Christine Baranski e Julie Walters, vivendo as amigas de Donna, Tanya e Rosie, poderiam ser alívios cômicos se não fossem somente os estereótipos das peruas atrapalhadas. Pierce Brosnan, Colin Firth e Stellan Skarsgard, respectivamente vivendo Sam, Harry e Bill, são os três ex-namorados de Donna que não possuem qualquer característica marcante que os faça serem lembrados, mal tendo espaço de tela para aceitarmos o antigo relacionamento com Donna. Além disso, os três atores ainda passam por momentos vergonhosos cantando nas performances musicais.

Ao término de “Mamma Mia!”, impressões ruins podem tomar conta do público por mais que as canções utilizadas tenham suas qualidades e sejam bem coreografadas. Um sentimento revelador de como esquetes musicais eficientes, personagens e roteiros paupérrimos e um tom geral de excessos cafonas não são suficientes para produzir um bom filme.