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“MEGATUBARÃO” – Cortejo à China

“Poderia ser pior”. Baseando-se nessa premissa, MEGATUBARÃO não é um filme tão ruim. Talvez possa servir como entretenimento sem conteúdo algum, tal qual inúmeros outros blockbusters descerebrados. Tudo de irracional, surreal e ilógico está lá, com a especificidade de ter um animal pré-histórico, um megalodonte, como vilão – ideia similar a “Jurassic Park: o parque dos dinossauros” (provavelmente a única semelhança).

No longa, o protagonista Jonas, um mergulhador especialista em resgates, mas que abandonou o ofício, é chamado para salvar uma equipe. Relutante, ele aceita, sem saber que vai encontrar um enorme megalodonte que já tinha enfrentado anos atrás. A explicação para o animal estar oculto durante tanto tempo é uma termoclina (uma espécie de barreira natural) – o máximo de ciência que há no roteiro.

Isso porque, no resto, a sequência de absurdos é acidentalmente cômica – ao contrário das piadas propositais, que não têm graça (como a associação entre a palavra “inserção” e sexo). O roteiro, escrito por Dean Georgaris, Jon Hoeber e Erich Hoeber, constitui um texto pavoroso e falho tanto no drama quanto na lição de moral que tenta apresentar. Todos os clichês dos filmes de monstros estão lá, inclusive o mais óbvio, referente aos sacrifícios altruístas.

A construção das personagens é também ruim, tendo em vista, inicialmente, um exagero quantitativo. Como não podia deixar de ser, os mais inúteis são os primeiros a morrer (só não morrem todos para a história poder continuar). Rainn Wilson vive sr. Morris, o ricaço estereotipado: desumano, estúpido e avesso à ciência. Quando apresentado, ele parece simpático, abraçando um funcionário. Porém, depois demonstra estar mais preocupado com a senha da wi-fi do que com a sobrevivência da sua equipe. Bingbing Li é provavelmente a pior do elenco, enquanto sua personagem, Suyin, passa a maior parte do tempo se arriscando para ser salva pelo protagonista. Exemplo da má qualidade de Li como atriz é a tranquilidade ao afirmar que o submarino onde está não conseguirá resistir à pressão exercida por uma lula gigante. Aos oito anos e falando duas línguas, provavelmente a personagem mais inteligente é Meiying (Shuya Sophia Cai).

Jason Statham interpreta o protagonista Jonas, o que é evidência da impossibilidade de exigir muito da película – afinal, Statham nunca foi bom ator. Construído por inconsistências, Jonas é o estereótipo do herói: dos salvamentos aos galanteios. Nada explica, por outro lado, como ele retorna aos dias de heroísmo com tanta facilidade, considerando o desleixo que demonstra quando chamado, além do discurso de não querer salvar mais ninguém. Se a ideia era que retomasse o casamento por salvar a ex, não faz sentido iniciar o romance com outra. E certamente a brincadeira de dizer que já sabia também não era motivação suficiente. Ou seja, a fala dispensando os colegas que o chamaram foi inútil.

Apesar dos vários defeitos mencionados, a direção de Jon Turteltaub não é das piores. O último trabalho do cineasta (em longas-metragens) foi em 2013, com o fraco “Última viagem a Vegas”. Seu currículo ostenta pérolas não distantes como “O aprendiz de feiticeiro” e “A lenda do tesouro perdido – livro dos segredos”. Como em outras ocasiões, o resultado final é ruim não pelo trabalho dele, mas pelo roteiro (sem um bom roteiro, diretor nenhum faz milagre).

Ao invés de optar por atenuar as cenas de maior violência, o diretor chega a mostrar o megalodonte comendo uma baleia (e o sangue se espalhando). Embora os efeitos visuais sejam pobres e artificiais – a transição do prólogo para a chegada em Xangai deixa claro o CGI mal executado -, o 3D é razoável (inclusive com uso de 3D ativo). É visível o intento em criar uma atmosfera de suspense, usando o clássico “Tubarão” como referência óbvia, em especial ao não mostrar o animal logo nos minutos iniciais (sem dúvida, um acerto). O recurso é utilizado também, por exemplo, com a lula gigante. Turteltaub escorrega, todavia, no uso de planos fechados e a câmera balançando, gerando um desconforto incompatível com a cena. Ainda assim, existem virtudes no seu trabalho, como na câmera subjetiva quando Jonas, dentro do mar, procura o mega para executar um plano arriscado. A tensão seria melhor provocada se a narrativa não fosse tão prosaica.

Reclamar apenas da estupidez do filme seria excesso de rigor, pois ele não tem a pretensão de ser minimamente inteligente. “Megatubarão”, na verdade, é mais um cortejo da indústria hollywoodiana ao público chinês (aproveitando para fazer marketing de uma gigante do ramo dos refrigerantes), até porque recebeu financiamento de lá. Não é comum que um filme nesses moldes tenha falas em chinês (exigindo legenda para o público estadunidense), tenha um elenco chinês e se passe em território oriental. Até mesmo a bandeira da China aparece no final! Talvez agrade o público sínico.