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“OPERAÇÃO FRONTEIRA” – A ação é só o ponto de partida

OPERAÇÃO FRONTEIRA é uma nova produção original Netflix, que chega ao catálogo do streaming despertando atenções em virtude dos nomes envolvidos no projeto: os atores Oscar Isaac, Ben Affleck e Pedro Pascal, o roteirista Mark Boal e a produtora Kathryn Bigelow (ambos de “Guerra ao terror” e “A hora mais escura”) e o diretor J.C. Chandor (de “Margin call”). Esses realizadores conseguiram reunir elenco tão conhecido graças ao roteiro povoado por críticas sociais e políticas sobre os EUA atual.

Tais comentários sobre a atualidade do país partem da trajetória de cinco ex-soldados das Forças Especiais norte-americanas, Tom Davis (Ben Affleck), Santiago Garcia (Oscar Isaac), Francisco Morales (Pedro Pascal) e Ben Miller (Garrett Hedlund). Após anos inativos, eles se reúnem para executar um arriscado plano: roubar um famoso e perigoso traficante de drogas na fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina. Quando o esquema não sai como o esperado, todos eles precisam lutar em um ambiente adverso por suas vidas.

Todos os personagens estão na mesma situação de abandono e marginalização em relação ao exército e ao governo norte-americano, mesmo após anos de serviços prestados. Tom é um homem divorciado que trabalha como corretor de imóveis e mal convive com sua filha; Santiago ainda trabalha em uma agência de combate às drogas, apesar de não ver progresso em suas atividades; William dá palestras motivacionais a soldados na ativa, ainda que seus sentimentos sejam diferentes de suas palavras; e Ben ganha a vida em lutas amadoras sob o treinamento de Francisco. Por não receberem assistência alguma e viverem em condição financeira precária, eles se reúnem, sob a influência de Santiago, para executar o plano com a ideia de que seria o pagamento de uma dívida ou um destino melhor para o dinheiro.

A premissa do filme traz contradições e potencialidades dramáticas que, em sua parte inicial não são tão exploradas. Como os personagens possuem um desenvolvimento raso, pouco conhecemos de suas personalidades e dos arcos que eles poderiam trilhar, à exceção feita para os personagens de Ben Affleck e Oscar Isaac. Tom e Santiago são minimante trabalhados para ser possível compreender suas motivações e características psicológicas durante o roubo. Em razão dessa deficiência, o comentário social a respeito do abandono sofrido por ex-soldados e das dificuldades em levar suas vidas adiante é abordado de modo muito rápido e insuficiente, tendo que se dividir com os tradicionais elementos narrativos encontrados em filmes de assalto (a formação da equipe, a elaboração do plano, a execução problemática…).

Do ponto de vista técnico, a primeira parte possui méritos por mais que não sejam aqueles que se destacam imediatamente. A montagem das sequências de roubo e de confronto militar torna o ritmo do planos moderado, algo essencial para a compreensão da geografia das cenas e das situações dramática retratadas – falta apenas um refinamento maior para destacar as dificuldades e os perigos que os cinco homens enfrentam quando o plano sofre falhas. A direção de J.C. Chandor não exagera nos cortes rápidos ou em enquadramentos chamativos, ela investe em movimentos fluidos de câmera (muitas vezes sem cortes) para enfocar a ação em si, o trabalho profissional da equipe e a violência praticada.

Diferentemente do que se poderia imaginar, não é a sequência de ação o ponto central do filme; o roteiro está mais preocupado em desenvolver o rastro de sangue, adversidades e tragédias que cerca o dinheiro. É passado o clímax do roubo que a narrativa cresce, destacando as consequências para cada um daqueles personagens de um plano ilegal visando ao acúmulo das riquezas. A ambição de levar uma quantia altíssima, além da estipulada anteriormente, os coloca em uma espiral de eventos negativos: as dificuldades de transportar tantos sacos, de lidar com o ódio despertado nos bandidos e de fugir da América do Sul. Tematicamente, Mark Boal e J.C. Chandor pretendem, portanto, trabalhar os males da cobiça na sociedade norte-americana, a partir de um conjunto de homens que divergem entre si e atacam pessoas inocentes ao colocarem as posses materiais em primeiro plano.

A metade final também reserva virtudes técnicas capazes de reforçar a discussão temática, através da fotografia. Esse aspecto cinematográfico cria um contraste entre o ambiente chuvoso e escuro dos momentos violentos da concretização do assalto, e o cenário claro e congelado pela neve da Cordilheira dos Andes, em que a ambição dos personagens deixa marcas definitivas em quem nada merece. A pequena ressalva estética diz respeito ao uso de canções populares do rock, como “Run Through The Jungle” do Creedence e “For Whom The Bells Tolls” do Metallica, muito mais para causar impacto nos fãs que reconhecerão suas predileções musicais do que para construir algum sentido dramático para a narrativa.  

Dividindo-se mais propriamente em duas metades do que em três arcos tradicionais, “Operação fronteira” tem resultados díspares em relação aos seus componentes. Se, por um lado, o desenvolvimento dos personagens deixa a desejar e não os transforma em pessoas multidimensionais e de características reconhecíveis, por outro, o desenvolvimento temático e a direção de J.C. Chandor compensam o problema. A escala crescente de qualidade e os acertos na última hora de projeção, sem dúvida, são fatores importantes para a impressão positiva após suas duas horas de duração.