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“PAULO, APÓSTOLO DE CRISTO” – Uma obra sobre a vida dedicada à fé

Certos filmes vendem de forma errônea seu conteúdo através de títulos enganosos. “PAULO, APÓSTOLO DE CRISTO” é um desses. Primeiramente, Cristo não aparece no filme. Além disso, reduzir a trama apenas à história dos últimos dias de Paulo parece, em princípio, um reducionismo, no sentido ruim da palavra. Mais para um drama sobre família e fé do que para uma biografia do apóstolo, o longa pode agradar tanto crentes quanto descrentes, através de uma história emocionante e atuações marcantes.

Lucas (Jim Caviezel) acompanhou o apóstolo Paulo (James Faulkner) por várias viagens, espalhando o evangelho de Cristo em vários lugares do mundo antigo. Porém, quando o Imperador Nero ordena a prisão e morte de Paulo, Lucas irá registrar seus últimos dias na tentativa de fortalecer a fé dos cristãos perseguidos. Enquanto isso, o prefeito da prisão onde Paulo está encarcerado, Maurício (Olivier Martinez) sofre com um drama em sua família, e é confrontado aos poucos com as palavras do apóstolo.

O grande problema desse filme é a demora para começar a funcionar. No primeiro ato, é difícil identificar se estamos olhando para uma obra biográfica do apóstolo ou uma história inspirada em seus últimos dias de vida. Soma-se isso ao péssimo histórico das adaptações da Bíblia para o cinema. Contudo, esse longa pode surpreender parte do público. O roteiro (escrito por Terrence Berden e Andrew Hyatt, que também dirige a obra) fornece uma perspectiva de Lucas sobre a história narrada, o que permite ao espectador acompanhar a evolução e a mansidão do personagem interpretado por Jim Caviezel. O ator não tinha um grande desafio em mãos, mas marca presença no filme. Sua interpretação faz diferença nos momentos em que a liderança de Lucas é requerida e, principalmente, nos diálogos com Paulo, que revelam de onde vem sua grande sabedoria para liderar e para a própria fé.

Há três perspectivas em conflito: a de Lucas, que tende a desacreditar na providência divina, pois Roma, sob o comando de Nero, está mais violenta do que nunca; a de Paulo, que quer honrar seus últimos momentos vivo com exemplo irrepreensível diante de seus opressores; e finalmente a de Maurício, o oficial romano que é exposto à mensagem do cristianismo e vive uma crise em seu lar, com a doença aparentemente incurável de sua filha. As atuações de Caviezel, James FaulknerOlivier Martinez, respectivamente, jogam luz nesse conflito através de sólidos trabalhos, honestos com a proposta do longa.

As tomadas optam, em muitos momentos, por posições e movimentos mais subjetivos, em que a luz do fundo do plano brilha com mais intensidade do que o que está à frente dele, criando sombras e as manipulando. O encontro de Paulo com Ananias (Manuel Cauchi), durante um flashback, exemplifica esse ponto, onde a prioridade é a luz do fundo, intensa e ofuscante. O diretor de fotografia, Gerardo Madrazo, parece insistir no que já foi entendido no começo do filme como uma luz metafísica, simbolizando Jesus. Os recursos para as cenas de tortura são pouco imersivos, além de a montagem não ajudar nessas sequências, resultando em material pouco impactante.

Aliás, o diretor diz, ao final do filme, dedicar essa obra a todos os que sofrem perseguição religiosa. O que é explicável, por exemplo, ao retratar o casal de cristãos acolhedores (Áquila e Priscila, John Lynch e Joanne Whalley, respectivamente) com riqueza de atributos bem intencionados, que choram pela morte do órfão e cuidam dos carentes na comunidade. Esse cuidado pelo futuro e pela fé tornam “Paulo, apóstolo de Cristo” um filme emocionante, que caracteriza com louvor a vida de um homem que, apesar dos erros, se mostra firme em suas convicções num mundo onde sua crença pode levar à morte. Embora navegue entre problemas (alguns graves, como a demora para engrenar), o filme ainda é uma obra convicta do que mostra, pisando em terreno firme e sólido ao propor uma reflexão pessoal sobre todos os temas que permeiam não só a religião, mas a vida como um todo.