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“SEXY POR ACIDENTE” – A beleza inegável está na autoconfiança

Existem muitos filmes pouco convincentes sobre aquela noção abstrata conhecida como “beleza interior”. Na contramão dessa ideia está SEXY POR ACIDENTE, não por desprezar a personalidade, muito menos por valorizar em demasia a estética, mas por defender que a autoconfiança é um valor positivo em si mesmo. No longa, a protagonista Renee é uma mulher insegura e que acredita que a aparência é o que conta na vida das mulheres (no trabalho e nas relações afetivas). Após um acidente, ela acorda com uma nova autoimagem, o que lhe dá a segurança que nunca teve.

O que Renee sempre quis foi alcançar a “beleza inegável”, ou seja, atingir um status estético que faça com que não tenha vergonha da própria aparência e receba a atenção dos homens. Na sua experiência, apenas as mulheres “inegavelmente belas” têm esse privilégio – por exemplo, quando ela cai de uma bicicleta ergométrica na aula de spinning, um homem que está na aula pergunta para a mulher ao lado (e não para a Renee, que sofreu a queda) se está bem. Existe um exagero para fins humorísticos, porém a conclusão da protagonista é que “a foto é só o que importa”. Como ela se considera feia, mulheres como ela têm duas opções nos aplicativos de relacionamentos afetivos: usar uma foto manipulada para decepcionar no primeiro encontro ou usar uma foto verdadeira e não causar interesse em nenhum homem. Entretanto, ela acaba descobrindo que mesmo as mulheres “inegavelmente bonitas” têm alguma insatisfação consigo mesmas.

A interpretação de Amy Schumer como Renee é excelente – provavelmente o melhor atributo do filme. Ela não é apenas engraçada, mas convence até mesmo nas mudanças psicológicas da personagem. Antes do acidente, ela é uma mulher tímida e muito envergonhada que quer passar despercebida na aula de spinning; depois, tudo nela muda, como a postura, o olhar e o jeito de caminhar. A linguagem corporal adotada pela atriz migra da introspecção para a autoconfiança de maneira eloquente, tornando-se, assim, uma mudança crível (mediante suspensão da descrença, é claro). Quando ela se descobre bonita, há uma empolgação crescente, um maravilhamento consigo mesma que envolve o espectador de maneira ímpar.

Entre os coadjuvantes, é uma pequena decepção a presença da gabaritada Michelle Williams em um papel aquém do seu talento – contudo, ela vai muito bem, como no engraçado trabalho de voz. Tom Hopper vive Grant, irmão de Avery (Williams), cuja função é ser apenas o homem bonito que vê um diferencial em Renee, o que o motiva a flertar com ela. Embora pareça que Grant vai ter alguma função a mais, não passa disso. O roteiro sugere algum tipo de atrito entre os dois irmãos (por que ele se esconde no avião? Por que Avery controla seus gastos?), mas que jamais recebe um mínimo aprofundamento. Parece que existe algo a mais ali, que, todavia, foi cortado da versão final – ou que foi negligenciado pelo script. Ainda entre os coadjuvantes, Rory Scovel interpreta Ethan, papel unidimensional e sem nenhuma cena importante, mas apenas algumas piadas em diálogos com Renee; e Adrian Martinez, coadjuvante cuja função narrativa está apenas no fim, mas que é muito engraçado ao manter a seriedade nos momentos mais inusitados.

Fazendo uma referência ao clássico “Quero ser grande”, a direção de Abby Kohn e Marc Silverstein não é muito inventiva – afinal, uma sequência de apresentação eficaz e uso de slow motion em momentos que merecem a atenção do espectador é pouco. Por exemplo, a trilha sonora se reduz a uma cena mais impactante com “Girl on fire”, enquanto diversas outras poderiam ter sido utilizadas para os propósitos do longa (“Oh, pretty woman”, por exemplo, seria uma referência elogiável). O design de produção, contudo, é um bom atributo da película, com cenários bem feitos (como o “porão esquisito de Chinatown”) e um figurino bastante expressivo. Quanto a este, a diferença do vestuário de Renee, antes do acidente, em comparação com as colegas do spinning é chamativa, pois ela é a única camuflando o próprio corpo, enquanto que, depois do evento, usa salto alto e coloca roupas mais curtas, como vestidos (além de soltar o cabelo). Também as cores são bem escolhidas: antes do acidente, ela usa tons rosados, simbolizando sua introspecção; depois, usa cores mais vivas, como vermelho (símbolo da sua maturidade enquanto mulher) e amarelo (símbolo do sucesso).

Sexy por acidente” tem um plot muito semelhante a “O Diabo veste Prada”, de certa forma, é uma versão mais cômica, em especial na nova vida de Renee, cujo arco dramático é similar ao de Andy. A diferença é que, enquanto o segundo é bastante efetivo ao transmitir sua mensagem, o primeiro não tem a mesma competência. É uma comédia que arranca boas risadas, mas que não alcança a plenitude comunicativa para dizer que autoconfiança importa mais que a aparência em si.