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“A MALDIÇÃO DO ESPELHO” – Mais terrível que terror

No mínimo, equivocado: essa é a descrição mais resumida para A MALDIÇÃO DO ESPELHO. Se fosse apenas um filme genérico, tornar-se-ia esquecível, mas não completamente ruim. Se fosse somente contraditório, poderia ter algo memorável. Mas não adianta: o terror russo se esforça para ser ruim em todos os aspectos.

No longa, Olga e seu irmão Artyom acabam de se mudar para um internato. No local, os dois acabam explorando uma área proibida, onde descobrem, juntamente com outros colegas, um recinto em que poderiam fazer pedidos à Rainha de Espadas. Ela concede os desejos, cobrando, todavia, um preço altíssimo ao iniciar um verdadeiro banho de sangue.

(© Paris Filmes / Divulgação)

Não é muito mais do que parece, ou seja, um terror qualquer de invocação de bruxa com mistura de casa mal-assombrada e assassinatos em série. O diretor Aleksandr Domogarov não é capaz de conceder contornos particulares à sua obra, porém é possível que existam virtudes (bem) ocultas por trás do desastre. Por exemplo, no prólogo, a câmera se posiciona bem ao final, quando a ocularização subjetiva poderia – não fosse o corte prematuro – aproximar o espectador da aflição inicial.

Da mesma forma, os cenários não são dos piores. Ainda que mal explorados, as lonas e as escadas das reformas do edifício fornecem bom potencial ao terror. No geral, o visual alcança até mesmo o nível do medíocre (o que é um elogio, dado o saldo da produção em termos qualitativos), como na oposição da iluminação azulada do mundo espelhado em contraposição ao amarelado mundo real. Mesmo anacrônica, a trilha musical não é desprezível.

O primeiro grande problema está na pavorosa construção de personagens. Estão lá a jovem com sobrepeso que sofre bullying e aceita passivamente, o adolescente rebelde, a dominada pela libido, o nerd, o professor atraente e assim por diante. Tudo dentro da máxima previsibilidade possível, inclusive ao ressalvar a bondade solitária do nerd. Em uma crise existencial, o filme fica em dúvida entre bruxaria e espíritos, colocando os dois como sinônimos. O pequeno Artyom começa vendo o espírito da mãe, mas depois esse mesmo espírito adota uma maquiagem grosseira para apavorar os demais estudantes – isso quando a estética não é de lona branca à “Sombras da vida”.

A lenda da Rainha de Espadas é mencionada como um clássico russo, porém não há nada memorável na história, representada em uma sequência já muitas vezes vista no cinema. Quando parece que tudo é uma oportunidade para abordar o afeto entre irmãos (o que o desfecho igualmente sugere), perceber a maneira fria da abordagem revela o quão patético o filme consegue ser.

Pior, o texto tem contradições gritantes. Em um internato tão qualificado, como pode haver tamanha bagunça? Como a diretora aceita que Olga decida onde vai dormir, ignorando a vontade do padrasto? Como não aparece nenhum adulto na noite em que os alunos acendem as luzes, ligam música em tom não muito baixo, bebem álcool e fumam cigarro (sem olvidar os gritos histéricos de Artyom)? Por que Olga ficou sem punição, se a diretora falou expressamente que a parte em reforma era de ingresso proibido? (Nesse caso, a justificativa de ser aluna nova é de uma tolice sem igual, ao menos para uma escola que não admite, em tese, alunos acordados após às vinte e duas horas) Como Artyom conseguiu parar no lago com tanta facilidade, se Olga chegou a ser flagrada? Pior, como Igor conseguiu chegar tão rapidamente ao local?

Para reforçar que “A maldição do espelho” é uma piada de mau gosto, a cereja do bolo: uma irritante dublagem em inglês, completamente dessincronizada, como não poderia deixar de ser, com os lábios russos do elenco. A voz estridente do dublador de Artyom é apenas um exemplo, nos minutos iniciais, do que o longa reserva. De fato, aterroriza, mas não no sentido buscado. Não é terror, é só terrível.