“BRINCANDO COM FOGO” – Não foi dessa vez, John Cena
Arnold Schwarzenegger: “Um tira no jardim de infância”. Sylvester Stallone: “Pequenos espiões 3D”. Jackie Chan: “Três ladrões e um bebê”. Vin Diesel: “Operação babá”. Dwayne Johnson: “Treinando o papai”. É bem comum que atores famosos por filmes de ação estilo “pancadaria” façam, ao menos uma vez na carreira, um filme voltado para a família, em que contracenam majoritariamente com crianças. Alguns deles até repetem a experiência, como Schwarzenegger (“Um herói de brinquedo” e Johnson (“O fada do dente”). Chegou a vez de John Cena, com BRINCANDO COM FOGO.
Na trama, Cena é o Superintendente (“Supe”) Jake Carson, bombeiro-paraquedista que segue orgulhosamente os passos do seu pai. Rígido no trabalho, acaba tendo de cuidar, juntamente com seus subordinados, de três crianças cujos pais não são encontrados.

Se John Cena acredita que “Brincando com fogo” é o passo que faltava para a sua carreira decolar – já que participa de filmes desde 2006, sempre com papéis pequenos e/ou filmes modestíssimos (usando aqui um eufemismo) -, provavelmente ele vai se decepcionar. O ex-lutador ainda não é verdadeiramente um ator e precisa melhorar muito para atingir o estrelato como conseguiram os colegas mencionados. Nenhum deles se destacou pelas atuações, mas pelo carisma e pelos filmes em si. No caso de Cena, é preciso melhorar o trabalho e a obra para ter um resultado apenas ruim.
O roteiro de Dan Ewen e Matt Lieberman não fornece ao diretor Andy Fickman muito material para fazer do filme um pouco mais que uma diversão voltada ao público de até dez anos de idade. É verdade que existem subtextos, como o backstory de Jake com o pai, a conversa entre o Capitão e Brynn e a carência afetiva das crianças. Porém, tudo é trabalhado de maneira tão rasa que é difícil chamar de subtexto: o backstory não é aprofundado (muito menos problematizado) jamais e a conversa é breve demais para estimular reflexão. No terceiro caso, todavia, há um pouco de substância.
O longa funciona melhor na parte adocicada do que na comédia. Vale dizer, o lado família é “menos ruim” que o humorístico. A primeira parte é pensada como comédia, com um humor incapaz de extrair risos de um adulto com neurônios operacionais. A partir de uma falsa reviravolta (solucionada magicamente), contudo, Jake passa a nutrir carinho pelo trio – algo que nem pode ser considerado spoiler, pois é mais do que previsível -, então os quatro se dão bem. Melhor dizendo, os quatro e “os três patetas” que trabalham com Supe. São eles: Capitão Mark (Keegan-Michael Key), Tenente Rodrigo (John Leguizamo) e Machado (Tyler Mane). O último, além de óbvio, é absolutamente sem graça.
Paralelamente a isso tudo, Judy Greer participa do filme como a dra. Hicks, cuja função é exclusivamente servir de par romântico ao protagonista, como se todo filme voltado para a família precisasse de um romance (que sequer precisa convencer, mas existir). Salvo por uma brincadeira sobre machismo, a cientista é uma personagem completamente oca. Sequer as crianças conseguem atuar bem: Brianna Hildebrand revela apenas uma expressão o filme todo, Christian Convery e Finley Rose Slater parecem robóticos, sem espontaneidade alguma. Claramente a direção do cast foi desastrosa.
O humor que a película se propõe é bastante pobre, usando clichês (como na cena em que Supe é ouvido pela dra. Hicks, sem saber, falando sobre ela), escatologia (a cena em que precisam limpar a menor), trapalhadas (a cena da extração, dentre outras), vexames visuais (atores com dancinhas e roupas que os envergonhariam em situações não fictícias) e quaisquer recursos estúpidos e inofensivos. São piadas que parecem ter sido feitas por crianças – já que só esse público-alvo consegue rir.
Após a reviravolta mencionada, o longa ganha um pouco mais de corpo e flerta com um subplot interessante relativo à carência afetiva infantil. Evidentemente, após um conflito entre a personalidade rígida de Supe (e, de certa forma, também dos seus subordinados) e a infantilidade inerente às crianças, o grupo passa a se dar bem. Nesse caso, o problema é o encaminhamento dado, graças a um final pavoroso em razão de uma coincidência inverossímil (duas autoridades chegam quase que no mesmo instante), absurdos para solucionar os problemas criados pelo próprio texto e situações surreais (como um bombeiro do nível do Comandante se recusaria a salvar as crianças?).
Quando usa recursos estilísticos, Fickman consegue piorar ainda mais a produção, por exemplo ao usar desnecessário slow motion e ao filmar os atores em contreplongée sem critério algum. Os efeitos visuais são péssimos (como na cena da mangueira); o design de som, genérico. John Cena vai precisar de filmes muito melhores para ter um currículo respeitável como hoje ostentam os colegas da ação.


Desde criança, era fascinado pela sétima arte e sonhava em ser escritor. Demorou, mas descobriu a possibilidade de unir o fascínio ao sonho.