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“DANÇARINA IMPERFEITA” – A leveza que tende ao vazio

Musicais não costumam agradar a todos os públicos. Musicais com personagens adolescentes parecem ser mais focados em apenas uma faixa etária. No entanto, é possível que obras para públicos limitados tragam boas contribuições para a arte ou apenas para o lazer.  O lançamento da Netflix DANÇARINA IMPERFEITA é um desses filmes que pretende agradar a uma faixa etária muito específica. Para isso, se propõe a divertir, traz romance e coreografias e mostra algumas reviravoltas sem se preocupar com transmitir uma grande mensagem. É um típico filme leve, mas cuja leveza tende ao vazio. 

(© Netflix / Divulgação)

O longa acompanha Quinn Ackerman, em sua tentativa de ingresso na universidade de seus sonhos. Para ser admitida, Quinn precisa demonstrar alguma atividade pela qual seja apaixonada. A adolescente diz à avaliadora que é integrante de um grupo de dança. No entanto, ela nunca havia dançado. Então, ela precisa aprender a dançar e formar um grupo com os melhores dançarinos da escola para participar de uma competição de dança e impressionar a recrutadora. 

O filme estabelece sua premissa rapidamente. Nós conhecemos Quinn a partir de seu próprio relato. Enquanto a protagonista fala sobre si mesma, algumas cenas ilustram o que ela diz. Portanto, o recurso utilizado pela diretora Laura Terruso foi a união do discurso expositivo com cenas exemplificativas. Com isso, nos primeiros minutos é possível perceber que o filme terá recursos para facilitar sua compreensão. Com esse relato, conhecemos a rotina de Quinn, algumas características comportamentais e sua motivação para selecionar a universidade. 

Após apresentar a protagonista, o roteiro aponta para a apresentação de seu contexto. Nesse momento, outros personagens aparecem para ajudar a compor a protagonista, mostrando como Quinn se distingue dos demais. A construção desses personagens é toda em função da personagem central, uma vez que eles não têm motivações próprias e as histórias pessoais são mostradas, de forma breve, apenas para aqueles que se tornam mais próximos de Quinn. 

A interpretação de Sabrina Carpenter está ao nível do roteiro. Ela precisava compor uma personagem em transformação. No começo, deveria mostrar timidez, determinação e dificuldades com a expressão corporal. No decorrer do filme, a personagem aprenderia a dançar e apresentaria mais desenvoltura na comunicação com outros personagens. A transição entre esses traços poderia ser mais sutil, mas acabou seguindo o ritmo do roteiro. A interpretação é suficiente para transmitir o que o filme pretendia. 

No elenco de apoio, ganham destaque Liza Koshy e Jordan Fisher. Liza compõe uma personagem engraçada, desenvolta e que ensina os primeiros passos de dança para Quinn. Ela é quem conduz os momentos em que o filme consegue divertir. Jordan Fisher não tinha um personagem complexo nas mãos. Ele apenas precisava ser charmoso e trazer os tons de drama e romance para o longa. O ator entrega uma interpretação marcada por sutilezas e boas cenas em dueto com Carpenter. Quando estão juntos, parecem à vontade e, apesar dos diálogos expositivos, criam as melhores interações.  

Em relação à trilha sonora, a captação de áudio é excelente e as músicas são inseridas para que os personagens dancem. Não há muito mais do que um uso correto das técnicas. Já na fotografia, é possível destacar que as paletas de cores são bem pensadas. A diretora traz cores vibrantes no figurino e no cenário com um encaixe perfeito na proposta da cena. Nas tomadas internas noturnas, ela utiliza tons em neon no segundo plano – o que dá maior vivacidade à cena. Outro ponto positivo é que a iluminação dessas cenas noturnas ajuda a contar a história, interagindo com os personagens. Então, é um dos recursos aplicados com maior intencionalidade. 

Além da boa fotografia, o filme tem detalhes que agradam. O elenco é bastante diversificado, tanto no que se refere à origem dos atores e das atrizes, quanto nos estilos de dança dos personagens. Aqui está o ponto mais forte do filme e que poderia ser explorado para criar uma produção mais impactante – ainda que mantivesse o foco no mesmo público. A composição do grupo poderia demonstrar as dificuldades da interação de estilos e personalidades diferentes. No entanto, o roteiro não explora esse aspecto e corre para cumprir sua fórmula pronta. 

Mesmo quando você aceita que pode não fazer parte do público-alvo do filme, os problemas são evidentes. Os diálogos são superficiais e expositivos. A jornada da protagonista tem mais reviravoltas do que o roteiro poderia contar e, por isso, as resoluções são fracas. Em momento algum descobrimos as motivações dos demais personagens. Por isso, a produção não funciona como filme de dança, nem como romance, tampouco como drama. Não se trata de uma adaptação à faixa etária. Trata-se de reproduzir a fórmula de outros filmes e deixar de aproveitar suas próprias forças. 

Um musical pode marcar pelas músicas, pelas coreografias ou pelo modo como integra a musicalidade na história. Em “Dançarina Imperfeita”, as músicas são esquecidas assim que se inicia a próxima cena, e as coreografias apenas lembram produções anteriores. No roteiro, a construção de personagens e dos conflitos é superficial e apressada. O subtítulo original do filme é “Dance to your own beat“. É uma pena que o longa não encontrou a sua própria batida. Por isso, tende ao vazio.