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“DEADPOOL 2” – Uma continuação pura e simples

Uma continuação genuína segue as premissas do seu predecessor, estabelece novos parâmetros dentro da necessária coerência e evolui na história de seu protagonista. Não se pode afirmar que DEADPOOL 2 não faz tudo isso, porém é necessário analisar se o faz da melhor maneira possível. Caso contrário, é apenas uma continuação pura e simples, não uma boa continuação.

Dessa vez, a missão do “mercenário tagarela”, o mutante Deadpool, é impedir que o implacável soldado Cable tenha êxito em uma inicialmente misteriosa missão. Ryan Reynolds não muda o tom da interpretação, entretanto ele assumiu uma função a mais nos bastidores: além de produtor, corroteirista. Isso apenas fortalece o seu gosto pelo anti-herói. Josh Brolin não apresenta em Cable a mesma imponência de Thanos (personagem que viveu em “Vingadores: guerra infinita”), é um antagonista de poucas palavras, mas ainda assim melhor que o do primeiro filme. No que se refere à construção das personagens, há um notório aprimoramento em relação à prequel: personagens já existentes ganham novas camadas (é o caso do taxista indiano Dopinder, que passa a ter um desejo profissional, bem como o de Míssil Adolescente Megassônico, que ganha um relacionamento afetivo), enquanto novas personagens já aparecem com conflitos internos (é o caso de Russell, vivido pelo razoável Julian Dennison). Não há espaço suficiente para explorar todas as personagens (Al e Weasel são irrelevantes na prática), mas o texto está melhor nesse quesito, não se reduzindo ao protagonista – afinal, agora aparece uma criativa adjuvante (Dominó, interpretada com competência por Zazie Beetz) e um opositor convincente (Cable).

O script também tem seus equívocos, entre diálogos sem inspiração (exemplo é a conversa repetitiva do primeiro contato entre Deadpool e Dominó) e a tentativa falha de criticar justiceiros (na conversa entre Colossus e Deadpool, quando aquele diz que este não pode ser juiz, júri e executor). Usando novamente uma narrativa com duas linhas temporais que se encontram – material e estruturalmente, há muitas repetições, em especial o uso da vingança como mola propulsora das ações das personagens -, o protagonista admite que o roteiro é fraco. Até mesmo essa mea culpa faz sentido no universo Deadpool, pois aparecem, mais uma vez, piadas e referências sobre tudo, de George W. Bush ao Universo Cinematográfico DC Comics. Também existem piadas bem infantis, como ocorre no primeiro filme – por exemplo, a conversa entre dois figurantes até Cable aparecer.

Atualizada, a narrativa aproveita assuntos que estão em voga – racismo, apropriação cultural e a questão de gênero (esta justifica a expressão X-Force) -, sempre com viés cômico. Algumas piadas são de gosto duvidoso (pedofilia é um assunto que dispensava o humor), porém há maior enfoque na ação dessa vez. A adrenalina ampliada tem explicação em Cable, que é um antagonista que não foge da luta, e no diretor do longa, David Leitch, responsável por “De volta ao jogo” (que recebe uma referência em “Deadpool 2”) e “Atômica”. Leitch não está no seu melhor, todavia seu trabalho está longe de ser ruim, como se denota, exemplificativamente, no uso de plano holandês em algumas cenas de ação e um plano de ponta-cabeça decorrente de câmera subjetiva durante uma perseguição. A trilha sonora mantém o nível, com clássicos de gêneros diversos – “Thunderstruck” (AC/DC), “We belong” (Pat Benatar), “Escape (the piña colada song)” (Rupert Holmes) e “9 to 5” (Dolly Parton) -, alguns raps e na adição da belíssima música original “Ashes”, cantada pela Celine Dion. A contradição entre a música e a cena não é novidade, mas agrada.

Quando toca “Ashes”, aparece uma excelente sequência de animação parodiando aquelas da franquia 007, como se “Deadpool 2” fosse sério. Mesmo considerando que é um filme sobre família (como dito pelo protagonista), afeto e união, sua peculiar irreverência leva à ilação de que o importante ali não é o conteúdo, mas a forma. Há momentos gore, um humor visual de piada repetida e um CGI mais competente que o do longa de 2016 (o braço do Cable é bem feito e os sons diegéticos que ele faz o tornam ainda mais convincente). Na quebra da quarta parede, contudo, há menos cenas em que Deadpool conversa com o público, priorizando a narração voice over, como se ele fosse um espectador da película (chega a mencionar as HQs, como se habitasse o universo real também).

A produção devia ser mais curta e o desfecho é decepcionante. Entretanto, as cenas pós-créditos são ótimas e o filme conta com participações especiais bem inesperadas. Contemporâneo e irreverente, “Deadpool 2” segue bastante a fórmula do primeiro, com mudanças pontuais para bem e para mal, a depender do aspecto analisado. Considerando tudo isso, é certo afirmar que o espectador que gostou do primeiro filme também gostará desse – o que corrobora a conclusão segundo a qual o nível deles é praticamente o mesmo.