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“PARA TODOS OS GAROTOS: AGORA E PARA SEMPRE” – Começo, meio e fim

* Para ler a crítica do primeiro filme, clique aqui. Para ler a do segundo, clique aqui.

Uma das lições mais básicas da narratologia é a divisão em três partes – começo, meio e fim. PARA TODOS OS GAROTOS: AGORA E PARA SEMPRE é a terceira da série “Para todos os garotos”, encerrando-a de maneira coerente e satisfatória. O que não significa que é um bom encerramento.

Lara Jean está em seu último ano do ensino médio. No próximo ano, poderá ser colega de Peter na Universidade de Stanford. Enquanto ele garantiu sua vaga através de uma bolsa, como praticante de lacrosse, ela foi rejeitada. O sonho de continuarem juntos parece desfalecer por força do futuro que os separa.

(© Netflix / Divulgação)

Os três filmes são baseados na obra original de Jenny Han, mas cada um deles se diferencia nos nomes do roteiro e da direção. Em termos estilísticos, embora Michael Fimognari tenha dirigido o segundo e o terceiro, o epílogo se aproxima mais do primeiro filme (que é dirigido por Susan Johnson) do que o trabalho anterior de Fimognari. Destacam-se dois aspectos gráficos que se tornaram marca registrada da trilogia. O primeiro é o uso intenso de três cores – rosa, azul e amarelo -, dando um visual infantil ao longa, mas também alegre.

O segundo destaque imagético é o uso de efeitos digitais, que servem para demarcar a narrativa em suas etapas: o prólogo em Seul, o retorno, o passeio do ensino médio, o segundo retorno, o baile e o casamento. É fácil perceber a divisão em três (primeiro ato com o prólogo e o retorno; segundo ato do passeio ao baile; terceiro ato com o casamento), corroborando a obsolescência do roteiro – não que a tripartição seja ruim, mas a demarcação é de um didatismo dispensável.

Com muitas festas, danças e músicas, a obra por vezes parece um gigantesco (quase duas horas de duração, completamente exageradas) clipe musical, que, contudo, é capaz de reforçar a atmosfera de cada momento. Fimognari aproveita que o roteiro de Katie Lovejoy amadurece o casal para mostrar a união mais sólida (por exemplo, mesmo distantes, a maneira pela qual conversam, por videoconferência, da forma como é filmada, em plano-contraplano, mostra que LJ e Peter estão mais apaixonados do que nunca). O segundo filme pode não ser edulcorado na mesma medida que os outros dois, mas é a ponte necessária para que o romance do terceiro seja convincente.

Ironicamente, Lara Jean descobre que seu namoro com Peter não tem todos os clichês das comédias românticas. Além de os dois estarem mais felizes, eles amadureceram muito individualmente e também como casal. A dúvida sobre a união não repousa em terceiros, mas nas intenções do próprio casal. Não há rivais, mas circunstâncias plausíveis que, no mínimo, vão dificultar o namoro. A solução dada pelo roteiro é de uma simplicidade risível e nada convincente em termos práticos, porém coesa com o lado poético da trilogia.

Existem excessos, como o sofá rosa, mas eles se apequenam diante de algumas virtudes do longa, especialmente o humor, que é, no mais das vezes, cirúrgico (“Tutti Frutti” como música do casal, a referência à franquia “Missão impossível” etc.) e o bom uso da subjetividade mental (a forma como “Wannabe” surge e ressurge é sagaz). Não são novidades, é verdade, mas dão solidez à trilogia, que certamente não é uma massa amorfa de longas-metragens.

Lara Jean e Peter mantêm o carisma concedido por seus intérpretes (Lana Condor e Noah Centineo, respectivamente), mas é perceptível que as outras personagens não têm suas vidas orbitando em volta dos dois. Kitty (Anna Cathcart) se interessa por um garoto, Dan (John Corbett) está superando a viuvez e Chris (Madeleine Arthur) cede às próprias vontades mascaradas. Alguns arcos narrativos são completamente alheios ao plot principal (é o caso do de Kitty), outros conseguem dar fluidez a ele (é o caso do Dan) e outros parecem laterais quando na verdade são bem relevantes para o desfecho (é o caso da subtrama de Peter com seu pai).

Na voz doce de Leah Nobel, a LeitmotivBeginning middle end” amarra a trilogia com grande eficiência. O defeito de “Agora e para sempre” é que a narrativa praticamente não avança e o desenvolvimento das personagens, embora perceptível, é tímido em demasia para um filme de pouco menos de duas horas. O filme é esteticamente agradável, mas a verdade é que quase nada acontece. Lara Jean e Peter quase não saem do lugar; mesmo que haja um fim, ele não é tão distante do meio quanto seria desejável – na verdade, se aproxima (de)mais do começo.