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“ROBIN HOOD – A ORIGEM” – História mal contada, ação mal filmada

Mais fácil que criar novas personagens é retomar personagens conhecidas do público e dar-lhes nova roupagem. ROBIN HOOD – A ORIGEM é, como diz o título, a história da origem do encapuzado de Sherwood, que até poderia dar um bom filme, não fossem os vários erros da produção.

Robin de Loxley é um nobre inglês convocado para servir como soldado nas Cruzadas. Quando retorna e percebe as mudanças ruins ocorridas em Nottingham, decide agir contra o mesmo xerife que o convocou. Trata-se de uma visão embrionária do famoso Robin Hood – mas que, na essência, não muda a ideia de “roubar dos ricos para dar aos pobres” (apesar de o longa pedir expressamente ao espectador para esquecer o que sabe).

O que muda bastante é a motivação da personagem: se Robin Hood é mantido como herói do povo, não é por altruísmo ou senso de justiça (ao menos no início), mas por vingança pessoal – ele chega a agir para causar inveja em um rival, o que claramente diverge do ideal de herói que qualquer um possa ter em mente. Lorde Loxley é bonzinho o suficiente para aceitar ser vítima de assalto, mas não imotivadamente (na verdade, ele tem segundas intenções). Entretanto, sua personalidade como um norte moral é evidenciada nas Cruzadas, em uma sequência que o aproxima do exemplo que deve ser.

Do outro lado está o Xerife de Nottingham, um vilão unidimensional (com direito a um capanga clichê) cujo passado rapidamente mencionado não é suficiente para desconstituir essa unidimensionalidade. Na verdade, ele é fantoche da Igreja, o que se torna um dos melhores aspectos do roteiro de Ben Chandler e David James Kelly: a ambientação do longa na época das Cruzadas, colocando o protagonista nesse contexto, permite não só explicar a coragem adquirida pelo jovem Rob como, no polo antagonista, retratar a relação promíscua entre a Igreja e o Estado. O clero é retratado como uma entidade podre na liderança e capilarmente frágil, ou seja, com líderes vorazes por mais poder e mais dinheiro, opostos aos representantes de menor hierarquia que, mesmo com bons valores, não têm mínima voz – é o caso de Tuck (Tim Minchin), um frei bondoso que não recebe bom tratamento de ninguém.

O subtexto da inversão de poder vai além do dinheiro: Robin Hood não age sozinho e percebe que a participação do povo pode ajudar nessa luta. O espírito rebelde do encapuzado é uma inspiração muito além do discurso e, se o tema fosse melhor trabalhado, estimularia mais a reflexão. Narrativamente, seria mais útil, por exemplo, que o insosso romance com Marian (Eve Hewson) – pior ainda é o triângulo amoroso com Will (Jamie Dornan), muito mal abordado.

Hewson e Dornan não são grandes artistas, o que, em tese, impede uma maior qualidade do longa. Entretanto, a dupla Robin-Xerife é bastante qualificada: Taron Egerton é um ator promissor que tem convencido em papéis de protagonistas virtuosos, enquanto Ben Mendelsohn tem facilidade com os vilões. Porém, a singeleza no trato textual das personagens não permite que façam muito. Nesse sentido, o John de Jamie Foxx sairia na vantagem por ser uma personagem mais complexa. Contudo, Foxx não está no seu melhor momento (e dizer que vai melhor que em “O espetacular Homem-Aranha 2: a ameaça de Electro” nem chega a ser um elogio ao oscarizado).

Otto Bathurst estreia na direção de longa-metragem, demonstrando ainda ter um caminho muito longo a percorrer. A tentativa de dar estilo aos primeiros e últimos minutos é quase risível: como porta de entrada, aparece um livro ilustrado; no final, frases relevantes (ditas pelas personagens) são repetidas em quadrinhos, quase como um resumo totalmente dispensável. A filmagem ocorre muitas vezes com pouca profundidade de campo, de modo que o fundo desfocado é esteticamente desagradável e sem função alguma.

Propondo-se como filme de ação, decepciona o fato de que as cenas de ação são mal filmadas, com excesso de cortes e uso de câmera na mão que as tornam confusas – salvo a cena da batalha no início, que repete consideravelmente o que é feito em filmes de guerra (substituindo armas de fogo por arcos e flechas). Como se não bastasse, o chroma key é péssimo, em nível inferior ao amadorismo na cena da carroça. A fotografia acerta ao valorizar tons pastéis e castanhos no primeiro ato, tons acinzentados escurecidos no segundo e retornar aos terrosos no terceiro. No entanto, do ponto de vista técnico, há erros do figurino – aquela jaqueta é moderna demais para uma vestimenta medieval – à trilha musical (que é, no mínimo, genérica).

Diante de tantos defeitos, ironicamente, a retomada de uma personagem que não precisava de um reboot não parece ser o pior dos males. A falta de criatividade é ruim, mas é pior ainda em se tratando de uma produção mal feita. Ao menos cumpre o que promete: uma história de origem em invólucro de filme de ação. Pena que a história é mal contada e a ação é mal filmada.