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“SONIC – O FILME” – Ouvindo o público

Na era digital, também o cinema precisou se adaptar. Uma imagem de bastidores pode ser suficiente para que, durante uma produção, o estúdio dê novo encaminhamento ao projeto. SONIC – O FILME é exemplo surpreendente da força da reação do público nas mídias sociais: após uma resposta popular negativa ao primeiro trailer, a estreia do longa foi adiada para que ajustes fossem feitos na animação.

Na trama, Sonic é um ouriço extremamente veloz que vive oculto e tranquilo observando os humanos até ser perseguido por um cientista maluco, dr. Robotnik. Para enfrentar o vilão, ele conta com a ajuda de pessoas de quem ele já era próximo sem que elas soubessem.

(© Paramount Pictures / Divulgação)

O roteiro de Joshua Miller é estruturado a partir de personagens unidimensionais, humor infantil e mensagens rasas. O protagonista tenta encontrar entretenimento quando está só, mas é na companhia de humanos que ele se sente confortável. Sonic é hiperativo e agitado tal qual uma criança, sempre apresentando um comportamento típico de um infante. Solitário, encontra em Tom (James Marsden) o amigo que sempre quis ter.

O problema não está na construção da personalidade de Sonic, que não pode fugir muito do perfil da criatura estranha que parece acelerada a todo momento. O problema é que o principal humano é um herói perfeito demais (seu defeito, como ele mesmo admite, é usar a wi-fi do vizinho). Sua esposa, Maddie (Tika Sumpter), não é muito diferente. Jim Carrey é o principal nome da produção, cumprindo fielmente o que o papel propõe: um vilão radicalmente caricato.

Doutor Robotnik é trajado quase que inteiramente de preto (casaco de corpo inteiro, luvas e óculos escuros), como se ele fosse apenas um vilão mau – posteriormente, de vermelho, porque ele é também sanguinário. Balela: o antagonista é um bullie arrogante e sem graça. Dividindo-se entre dançar sozinho e humilhar todos que estão ao seu redor (do ajudante que o bajula a Tom, tratado como caipira), ele é repetitivo e sem brilho.

Exceto por uma boa piada no prédio onde estão os anéis de Sonic (que funcionam como macguffin na narrativa), o humor é bastante infantil, o que se percebe logo no começo, quando Tom acerta o próprio rosto. Nesse quesito, o público-alvo parece ser inferior a seis anos, o que não faz sentido ao se considerar as referências textuais (menção a Obi-Wan e a “grandes poderes”, dentre outras falas). O script não é dos melhores em relação às suas mensagens sobre o conceito de lar e a importância da amizade, tendo ainda um furo desnecessário (qual a razão de envolver as autoridades se quem age é um cientista que passa a se motivar por si mesmo?), mas é funcional e fiel ao jogo.

A mitologia de Sonic se faz bastante presente no longa, cujo ritmo soa como o de um game. Considerando o hiperativo protagonista, a velocidade enquanto temática é abordada por ferramentas visuais (como a cena jogando baseball) e sonora (“Don’t stop me now”), o que torna a película dinâmica e divertida, mas decepciona o desperdício dos cenários diversificados (como as Pirâmides de Gizé e a Torre Eiffel).

O diretor Jeff Fowler não é dos mais criativos na obra, fazendo inclusive uma cena idêntica (do ponto de vista do espírito) à protagonizada por outro velocista da ficção. Por outro lado, foi ele quem assumiu que os efeitos visuais empregados na primeira versão (que seria a definitiva, aquela exposta no trailer inicial) eram ruins (especialmente no protagonista, que estava esquisito). Os espinhos de Sonic agora parecem plastificados, mas não causam a estranheza de antes e, principalmente, poderão agradar os fãs dos jogos. No geral, as sequências de ação são bem razoáveis (uma delas, com referência ao batmóvel da trilogia Nolan), principalmente no show pirotécnico do clímax (neste, a referência é a “Vingadores: guerra infinita”).

Enquanto filme, “Sonic” é uma homenagem honesta a uma bem-sucedida franquia de games. O fato de os bastidores – o adiamento da estreia para melhorar o CGI – serem mais interessantes que o resultado final é capaz de simbolizar a fragilidade da produção. O ideal seria que o filme não tivesse uma continuação, servindo apenas como ode à mídia original (e aos seus fãs). Porém, a cena pós-créditos deixa muito clara a vontade de fazer sequências. Bom seria se também quanto a isso o público se manifestasse negativamente. Nesse caso, é pequena a probabilidade de que fosse ouvido.