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“UNCHARTED – FORA DO MAPA” – Alguma adrenalina, alguma busca interessante e alguma reflexão

Não há nada em UNCHARTED – FORA DO MAPA que já não tenha sido visto em filmes (ou mesmo jogos) no qual o longa se espelhou, tais como as franquias “Indiana Jones”, “Tomb Raider” e “A lenda do Tesouro Perdido”. Em termos qualitativos, o longa é melhor que “Tomb Raider: a origem” (2018), mas certamente habita um universo distinto de “Os caçadores da arca perdida” (1981). De positivo, no máximo, ele tem alguma adrenalina, alguma busca interessante e alguma reflexão (ainda que rasa).

Nathan “Nate” Drake está acostumado com pequenos furtos e uma vida pacata como barman, à espera das aventuras que vivia com seu irmão Sam, antes de seu sumiço, quando eram adolescentes. Quando aparece Victor “Sully” Sullivan oferecendo a Nate uma busca pela desaparecida fortuna de Fernão de Magalhães e a chance de encontrar Sam, sua vida se torna bem mais agitada.

(© SONY PICTURES / Divulgação)

Pela sinopse, pode parecer que o texto escrito por Rafa Judkins, Art Marcum, Matt Holloway, Jon Hanley Rosenberg e Mark D. Walker oferece algum conteúdo histórico. Não é o caso. Em seu começo, a trama é bagunçada e mal explicada, o que não é resolvido, mas melhorado quando o diretor Ruben Fleischer diminui o ritmo da sua obra, na segunda metade. Até então, a verborragia é mal utilizada e polui o começo da ação. Não são poucas as lacunas, do backstory das personagens (se é que é possível chamá-las assim, já que não há desenvolvimento algum, sequer em relação ao protagonista) a artefatos (a cruz de Chloe). Isso tudo sem contar, é claro, a colossal dose de suspensão de descrença exigida pelo filme, que vai de furtos mágicos (como a da cruz na mala de Nate, que seria bem mais interessante se um plano-detalhe o revelasse) a inverossimilhanças evitáveis (se Nate e Chloe chegariam a uma praia, qual o motivo de colocá-los em alto-mar por tantos segundos inúteis?).

Há diversas imperfeições no roteiro. Do ponto de vista narrativo, por exemplo, Nate muda de ideia com muita facilidade ao ligar para Sully (o que era previsível, mas poderia ter demorado mais). O texto é ainda preenchido com frases de efeito (“a grandeza está em pequenos começos”, “se algo está perdido, pode ser encontrado” etc.) que, no mínimo, não precisavam ser repetidas tantas vezes. O público-alvo é claramente o infantojuvenil, o que se denota pelo humor bastante infantil (a piada do gato, o medo de freiras…) e pelas escolhas gráficas (o sangue praticamente não aparece mesmo em cortes e a violência é bem leve). A escolha de Tom Holland para o papel principal tem como intenção óbvia ampliar o público aproveitando o hype em torno de seu papel como Homem-Aranha (persona que ele não consegue eliminar ao viver Nate). Holland é carismático e aceita ser objetificado (dada a quantidade de cenas sem camisa) para alargar a plateia. Sua atuação, porém, deixa muito a desejar.

Os coadjuvantes masculinos são ainda piores. Mark Wahlberg nunca foi bom ator e seu Sully não seria exceção. A sua escolha para o papel, assim como a de Holland para o de Nate, tornam explícita a vontade dos estúdios em criar uma franquia, de modo que o envelhecimento de ambos com o passar dos anos não será problema (já que os originais dos jogos, ambos, são mais velhos). No elenco está também Antonio Banderas, ator consagrado que, como muitos fazem, aceitou o projeto apenas para inflar a conta bancária, já que sua participação é pequena e completamente desinteressante. Santiago Moncada é um vilão ruim que tinha potencial, mas que acaba sendo ofuscado pelo seu braço-direito, Braddock – o papel a que Tati Gabrielle dá vida é um dos pontos altos da película. Além de a atriz ter bastante participação, ela compreende o perfil unidimensional da vilã e convence nas cenas de ação (que inexistem com Banderas). Outra coadjuvante boa é Sophia Ali, a despeito de Chloe ser mal aproveitada em sua interação com Nate (que, em homenagem ao público-alvo, é ingênua, quase angelical).

Ao contrário do que pode parecer pelas linhas precedentes, “Uncharted: fora do mapa” não é um filme ruim e tem alguns predicados. Há cenas de ação (a “alguma adrenalina”) razoáveis, incluindo uma sequência muito boa no céu (que é minada pelo prólogo in media res, adiantando-a desnecessariamente, mas ainda assim é muito boa). Quando o ritmo desacelera, Fleischer torna interessante a empreitada (a “alguma busca”) de Nate pelo tesouro, com descobertas capazes de prender a atenção do espectador e fazê-lo querer mais. A dinâmica das personagens talvez provoque um pensamento (a “alguma reflexão”) sobre a confiança que se deposita nas pessoas. Evidentemente, o mero fato de Nate colocar sua vida nas mãos de um desconhecido torna a ideia deveras superficial, porém as reviravoltas podem levar a plateia a pensar sobre a importância de ser confiável. Afinal, trata-se de uma plateia infantojuvenil.