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“VINGADORES: ERA DE ULTRON” – Aventura divertida, porém menor

O universo cinematográfico da Marvel foi pensado para entrelaçar diversos filmes em fases que culminam no encontro dos principais heróis. Foi assim com “Homem de ferro“, “O incrível Hulk“, “Homem de ferro 2“, “Thor“, “Capitão América: o primeiro vingador” para chegar em “Os Vingadores” e em sua apoteose de sucesso de público e de adaptação de quadrinhos (clique aqui para ler a nossa crítica). Os fãs aguardavam o mesmo trajeto para VINGADORES: ERA DE ULTRON (apesar das oscilações dos fracos e/ou irregulares “Homem de ferro 3” e “Thor: Mundo sombrio“). Já conhecíamos os métodos da empresa, os personagens e o estilo dominante das produções. Só não podíamos esperar uma ligeira queda de nível.

Nessa continuação, o grupo de heróis precisa enfrentar o vilão tecnológico Ultron e seu plano de extinção da raça humana, quando é criado após uma falha num programa científico desenvolvido por Tony Stark em busca da paz mundial. A trama é o ponto de partida para continuar tratando uma questão já iniciada em seu antecessor: como reunir indivíduos tão diferentes e fazê-los trabalhar juntos, mantendo sob controle seus egos, defeitos e particularidades. Se o primeiro filme trabalhava os estranhamentos iniciais dos personagens e suas necessidades de encontrar um modo de conviver, esse segundo avança os problemas ao contrapor o individualismo egocêntrico representado por Tony Stark e o senso de equipe necessário em situações arriscadas.

O trabalho em conjunto dos Vingadores é construído visualmente pelo diretor Joss Whedon em sequências de ação já familiares ao espectador. A abertura do filme e o clímax do terceiro ato recorrem à mesma estratégia: planos relativamente longos e sem cortes com a câmera passeando pelos locais da batalha enquanto registra alternadamente cada um dos heróis em ação; percebemos como todos eles possuem sua importância nas lutas travadas e podem se completar através de uma constante ajuda mútua. Essa escolha também depende de outros dois fatores, utilizados com moderação e propósito: os efeitos digitais eficientes, que são orgânicos dentro da narrativa sem passar perto de qualquer tipo de artificialidade pronunciada, além de um cuidado em trazer piadas pontuais e balanceadas que não enfraqueçam o tom dramático ou de urgência de cada momento.

A interação entre os personagens também indica maior maturidade dos atores e do roteiro para conduzir os conflitos dentro da narrativa. Robert Downey Jr., Chris Evans, Chris Hemsworth, Mark Ruffalo e Scarlett Johansson estão mais seguros em seus personagens e desenvolvem características muito semelhantes já vistas no primeiro filme.  Em relação ao elenco fixo, o destaque fica por conta de Jeremy Renner e da possibilidade de mostrar um nova faceta de seu Gavião Arqueiro: o homem comum Clint Barton, com preocupações cotidianas e que também precisa zelar por sua família (nesse sentido, quando o filme parece querer respirar da adrenalina das sequências de ação e volta sua atenção para a família do Gavião, somos surpreendidos com alguns dos momentos mais inspirados e ternos do longa). Entre as novas aparições, temos os irmãos Maximoff, vividos por uma intensa Elizabeth Olsen nas várias emoções pelas quais precisa atravessar e por um apático e nada carismático Aaron Taylor-Johnson; além da criatura sintética Visão, interpretada por Paul Bettany com uma mistura entre frieza distante, inteligência profunda e ingenuidade infantil.

Já a novidade do vilão Ultron rende sentimentos contraditórios. A composição visual do personagem proporciona grandes acertos ao analisarmos o trabalho de design sonoro que capta as sutilezas das inflexões vocais do ator James Spader, divertindo-se nas variações de seu tom de voz; outro mérito está na técnica de captura de movimentos que consegue reproduzir, através dos efeitos digitais, um ser com os maneirismos corporais do ator (reparem, por exemplo, nas inclinações do corpo ou da face características de um ser humano). Entretanto, o potencial do vilão não é devidamente explorado, uma vez que sua ameaça tecnológica em larga escala é citada muito brevemente, e suas provocações acerca das mazelas causadas pela humanidade são pontuadas com pouco desenvolvimento. Detalhe à parte: o grande plano de destruição dos seres humanos de um vilão tido como perigosíssimo seria apenas içar a superfície terrestre e atirá-la de uma altura elevada?

Porém, o maior defeito do filme começa a aparecer na passagem do meio do segundo ato para o terceiro. A partir do momento em que deixamos a moradia isolada de Clint Barton e de sua família, o trabalho de montagem é caótico e prejudica o entendimento da trama. As sequências fechadas em si mesmo são compreensíveis e filmadas de maneira organizada, já a costura ou ligação entre elas é espantosamente confusa. Citemos como exemplo a cena solta em que vemos Thor lidando com a visão traumática estimulada pela manipulação mental feita pela Feiticeira Escarlate. Ela aparece de surpresa e fora de lugar, mostrando como, nesse e em vários outros casos, é difícil entender os deslocamentos dos personagens pelos cenários filmados. A sensação é de que na ilha de edição, algumas sequências cortadas fazem muita falta para o resultado final da obra.

O balanço dos prós e contras de “Vingadores: Era de Ultron” parece querer dizer que exigências megalomaníacas dos produtores se sobrepuseram às escolhas artísticas de Joss Whedon. Não há um equilíbrio preciso de tons entre a intimidade e a introspecção dos personagens e a pretensão constante de construir sequências de ação de uma escala grandiosa. Pena que esses heróis não puderam deixar a ficção também para proteger a arte acima dos negócios.