Nosso Cinema

A melhor fonte de críticas de cinema

“TURMA DA MÔNICA JOVEM: REFLEXOS DO MEDO” – Choque geracional

Turma da Mônica: Laços” explora o lúdico do universo infantil. “Turma da Mônica: Lições” trabalha os anseios do crescimento. E TURMA DA MÔNICA JOVEM: REFLEXOS DO MEDO poderia dar continuidade ao universo cinematográfico inspirado nos quadrinhos de Maurício de Sousa explorando o quê? É difícil esboçar uma ideia de resposta se o próprio filme não se faz essa pergunta. Não tendo um questionamento assim, ele próprio parece perdido que pretende dizer ou fazer.

(© Imagem Filmes / Divulgação)

Dessa vez, os quatro amigos estão na adolescência e entrando no Ensino Médio. Mônica, Cebola, Magali e Cascão chegam a uma nova escola e se deparam com uma surpresa: o Museu do Limoeiro, ao lado do colégio, será leiloado. Enquanto buscam uma maneira de evitar o leilão para preservar as histórias e as memórias da cidade, uma aventura inesperada se apresenta para eles. Alguns acontecimentos estranhos em torno do museu sugerem que uma ameaça muito maior está por perto, precisando ser enfrentada pelos quatro adolescentes.

O terceiro filme reformula o universo em muitos aspectos. O elenco é outro e a direção pertence a Mauricio Eça. Tais mudanças, em parte, se justificam pela chegada a uma nova fase da vida, ou seja, a adolescência. Porém, o diretor, diferentemente, de Daniel Rezende tem dificuldade de traduzir visual e dramaturgicamente as características dessa faixa etária e de seu mundo próprio no tempo atual. Em sua maioria, a narrativa parece descolada do momento em que é lançada e se assemelha muito mais a certa imagem do que poderia ser a escola no passado recente. A rivalidade de Mônica com Carmem, a disputa pela presidência do grêmio escolar, a referência vazia ao museu local (resumido simplesmente a uma coleção de lendas urbanas) e a própria dinâmica entre os protagonistas evoca um olhar de outro tempo tentando caracterizar o presente juvenil. A presença muito discreta do celular ou de outras tecnologias e a menção sutil demais à diversidade de identidades no ambiente escolar ressaltam os obstáculos para, de fato, penetrar no universo pretendido.

A diferença temporal também prejudica a construção do grupo principal de personagens. Isoladamente ou em conjunto, Cebola, Mônica, Cascão e Magali são figuras pouco expressivas. Cada um deles tem um rascunho de arco pessoal que apenas é pincelado e não ganha tanta força: Mônica com a dificuldade de conter seus impulsos, Cebola com a paixão não declarada por Mônica, Magali com a entrada em uma ordem mágica de cozinheiros e Cascão com o medo das lendas urbanas da cidade associado a uma saudade do tio. Reunidos, custam a demonstrar uma amizade forte que viria de longa data. Muito disso vem da direção de atores, que peca em transmitir a cumplicidade entre os quatro jovens e uma história em comum partilhada por eles. É o que se sobressai da primeira sequência em que estão juntos, conversando em um parque sem a espontaneidade que combinaria com o convívio (somado a presença dos colegas Milena e DC). Sendo assim, Xande Valois, Théo Salomão, Bianca Paiva e Sophia Valverde (um pouco menos ela) parecem recitar os diálogos sem se apropriarem deles com energia e fluidez.

Por um bom tempo, a própria narrativa não encontra um eixo para se apoiar e circula por diferentes possibilidades. Inicialmente, poderia ser uma trama dedicada às interações dos personagens dentro da escola, trazendo para o primeiro plano os atritos entre Mônica e Carmem e o eventual bullying que os estudantes veteranos poderiam fazer com os recém-chegados. Em seguida, há uma alteração de foco e a questão do leilão do museu ganha destaque, embora a sequência que deveria apresentá-lo seja bastante desorganizada e incapaz de revelar o acervo que possui, o valor para os moradores e até um aspecto sobrenatural que poderia ter. Por sinal, os eventos que se sucedem dentro do museu e deixam algumas pessoas catatônicas desafiam explicações lógicas e indicam a presença do sobrenatural. Diante de tantos caminhos possíveis, a produção não consegue combiná-los sem parecer uma colcha de retalhos e custa a mostrar o que realmente quer encenar.

Quando enfim se pode identificar qual abordagem o filme pretende adotar, outro choque acontece. De fato, é uma aventura com toques de mistério, ficção científica e terror, porém sem encontrar um tom adequado. Os protagonistas se envolvem em uma investigação para descobrir a fonte dos eventos estranhos ocorridos no museu que afetam alguns personagens que por lá passam, aproximando-se cada vez mais de uma ameaça sobrenatural. No entanto, a faixa etária de Mônica, Cebola, Cascão e Magali não se adequa à perspectiva dada a essa aventura, que é mais infantil do que o período da adolescência. Trata-se de um conflito e de um desenvolvimento que combinariam mais com os dois filmes anteriores, em função do estágio da vida dos personagens. O vilão em si logo se revela desinteressante, sem uma mitologia que chame a atenção ou um objetivo que minimante gere algum risco. E a construção das cenas que preparam o mistério e configuram os ataques desse antagonista tem uma resolução simplista, que parece vir daquele tipo de filme voltado para um público tão novo que ainda não consegue seguir a gramática do cinema.

Então, a direção de Mauricio Eça não dá um sentido estético particular para o que se vê em tela e apenas ilustra o roteiro com escolhas formais burocráticas. O trabalho é mais pragmático do que singular do ponto de vista artístico, dando a entender que o cineasta filma as cenas sem ter uma ideia muito clara do que elas podem proporcionar para além da primeira camada imediata do que trazem. Em determinados momentos, a desorganização prevalece e as sequências pouco se comunicam entre si. A passagem de tempo entre elas é aleatória, as ações dos personagens não apresentam relação entre si e o quadro geral formado por questões próprias da adolescência e pela trama sobrenatural avança através de quebras e interrupções incoerentes. Nesse sentido, surge uma personagem para explicar o que está em jogo nas atitudes do vilão e são tantos elementos diferentes misturados que a explicação confunde mais do que ajuda. sem Em outros instantes, as sequências são inexpressivas, construídas, em tese, para provocar uma reação específica, mas sem conseguir passar humor quando Cebola faz uma piada ou quando Cascão teme uma situação de perigo.

Turma da Mônica: Lições” já havia esbarrado em mensagens edificantes em um clímax que conseguiria passar sua ideia central de outras formas. “Turma da Mônica jovem: Reflexos do medo” depende ainda mais de frases inspiradoras sobre o poder do amor para superar o mal, pois não há uma construção estética organizada. Após o clímax, o filme tenta encontrar algum subtexto que deveria conformar toda a narrativa. A procura, no entanto, é tardia e os últimos minutos se destinam a impor uma síntese que não havia sido sequer sugerida anteriormente. Houve algo ao longo da obra que tenha feito Mônica, Magali, Cebolinha e Cascão a temerem pelo seu afastamento? Essa pergunta se apresenta muito mais do que aquela feita no primeiro parágrafo. Possivelmente, porque o diretor tem uma imagem distanciada do que seria a adolescência e a aventura está alguns anos abaixo de seus personagens.